Entrevista concedida a revista Sabor e Vida diabéticos em Jan/2011, publicação da Sociedade Brasileira de Diabetes.
Sabor e Vida Diabéticos: Em decorrência da doença, o portador de diabetes é mais sensível a determinados problemas bucais? Em caso positivo, por que? E quais seriam esses problemas?
Dr.Luciano: Com relação a cáries, as informações são controversas: enquanto algumas pesquisas verificaram índices aumentados nestes pacientes, outras encontraram taxas ainda menores quando comparados a não diabéticos. Uma possível explicação seria que indivíduos com níveis de glicose sangüínea mal controlados, trariam também na saliva quantidades aumentadas de açúcares, o que em parte poderia alterar a formação da placa dental bacteriana, favorecendo o surgimento de cáries. Por outro lado, a ingestão limitada de carboidratos, comum neste grupo de pacientes, proporciona uma dieta menos cariogênica, o que diminuiria o risco a estas lesões. Já com relação às doenças periodontais, uma maior prevalência e severidade tem sido relatada entre diabéticos. Estes achados parecem correlacionar-se ao grau de controle metabólico, assim como ao tempo de duração do diabetes e a presença de complicações médicas a ele associadas. Os sinais clínicos orais do diabetes não diagnosticado ou mal controlado podem incluir queilose ( conhecido por “sapinho”), fissuras, ressecamento de mucosas, dificuldades de cicatrização e alterações na microbiota oral. A xerostomia ou diminuição do fluxo salivar, observada com freqüência e responsável em parte pela síndrome da ardência bucal, mostra-se também relacionada ao grau de controle glicêmico, já que neuropatias, assim como medicamentos utilizados no controle do diabetes, podem interferir na secreção salivar.A presença de candidíase oral parece também estar relacionada ao grau de controle glicêmico.
Sabor e Vida Diabéticos: Qual é a frequência indicada para consultar um dentista?
Dr.Luciano: Não existe uma frequência pre-determinada para visitar-se o dentista. Isto vale para diabéticos e não diabéticos. O profissional deve saber identificar os casos que precisam de maior atenção. Entretanto, exames regulares serão sempre mais eficazes em diagnosticar e prevenir o surgimento de doenças.
Sabor e Vida Diabéticos: O portador de diabetes deverá ir ao dentista com maior frequência que pacientes saudáveis? pq?
Dr.Luciano: Como já dito anteriormente, a frequência do paciente diabético ao dentista deverá seguir orientação profissional. De maneira geral, aqueles com bom controle do diabetes terão menos intercorrências e por consequência, irão menos frequentemente ao dentista.
Sabor e Vida Diabéticos: O que é periodontite?
Dr.Luciano: A periodontite é uma infecção crônica, caracterizada pela continua destruição dos tecidos que sustentam os dentes aos ossos maxilares. Nestas doenças, a carga enzimática local liberada para conter a agressão bacteriana é algumas vezes tão forte que termina por gerar prejuízos ao próprio indivíduo. A lenta e frequentemente indolor degeneração destes tecidos termina por comprometer a implantação dos dentes, podendo até mesmo levá-los à esfoliação espontânea.
Sabor e Vida Diabéticos : Qual sua principal causa?
Dr.Luciano: As periodontites desenvolvem-se a partir da colonização da superfície dentária por um grupo específico de microorganismos que ao encontrarem um ambiente favorável e um indivíduo geneticamente susceptível, iniciam uma série de eventos danosos .
Sabor e Vida Diabéticos: E os sintomas?
Dr.Luciano: São freqüentemente observados: o aumento da mobilidade dentária, a migração ou deslocamento dos dentes, o sangramento gengival espontâneo ou estimulado. São eventualmente encontrados: halitose e dor.
Sabor e Vida Diabéticos : É possível que esteja presente sem apresentar sintomas?
Dr.Luciano: Sim, pois como muitas outras doenças crônicas, apresenta intervalos de remissão nos quais não é possível encontrar sinais clínicos evidentes.
Sabor e Vida Diabéticos: Os pacientes com pior controle do açúcar no sangue tem doença periodontal mais frequente e severa?
Dr.Luciano: Uma maior prevalência e severidade de doenças periodontais em pacientes diabéticos quando comparados a não diabéticos tem sido verificada em todo o mundo. Estes achados parecem correlacionar-se ao grau de controle metabólico, assim como ao tempo de duração do diabetes e a presença de complicações médicas a ele associadas. De forma análoga, acredita-se que doenças periodontais aumentem a severidade do diabetes e comprometam o controle metabólico de forma similar a outros estados infecciosos sistêmicos. Este feedback oculto parece funcionar de forma silenciosa, como já evidenciado por estudos que demonstraram maiores necessidades de tratamento periodontal entre indivíduos diabéticos.
Sabor e Vida Diabéticos: Quais seriam os riscos do não tratamento de uma periodontite ao paciente diabético?
Dr.Luciano: Muitas pesquisas indicam uma relação significativa entre deterioração periodontal e elevados níveis de hemoglobina glicada. Estes achados sugerem que modificações nos níveis da inflamação gengival podem impactar sobre o controle glicêmico. Assim, podemos assumir que o não tratamento de uma periodontite poderia interferir negativamente no controle do diabetes.
Sabor e Vida Diabéticos: A presença de infecção ou inflamação periodontal também influência o controle glicêmico em portadores de diabetes? Ela pode aumentar a resistência à insulina? Por que?
Dr.Luciano: Alguns mecanismos podem explicar o impacto da infecção periodontal sobre o controle glicêmico. Como sabido, a inflamação sistêmica possui um importante papel sobre a sensibilidade insulínica e a dinâmica da glicose. Pesquisas recentes sugerem que doenças periodontais podem também induzir ou perpetuar um estado inflamatório crônico sistêmico, como evidente através das dosagens séricas elevadas de proteína C-reativa, interleucina-6 (IL-6) e fibrinogênio em muitos indivíduos com periodontites. Inflamação, de maneira geral, induz resistência insulínica e tal resistência freqüentemente é acompanhada por infecções sistêmicas. De forma similar, periodontites poderiam aumentar o estado inflamatório sistêmico, exacerbando a resistência insulínica. O fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa), importante mediador pró-inflamatório, produzido em abundância tanto em adipócitos como em sítios de periodontites, aumenta a resistência insulínica, por prevenir a autofosforilação do receptor tirosina quinase. A interleucina-6, potente estimulador da produção de TNF-alfa, tem sido também observada no soro de indivíduos com doenças periodontais.
Sabor e Vida Diabéticos: O tratamento da doença periodontal pode melhorar o controle metabólico?
Dr.Luciano: Pesquisas intervencionistas sugerem um potencial benefício metabólico obtido a partir do tratamento periodontal. Estudos recentes indicam uma relação significativa entre infecção periodontal e elevados níveis de hemoglobina glicada. Estes resultados sugerem que modificações nos níveis da inflamação gengival após o tratamento periodontal podem também impactar positivamente sobre os controles glicêmico e metabólico dos pacientes.
Sabor e Vida Diabéticos : Qual é a relação da saúde bucal e problemas cardiovasculares?
Dr.Luciano: Em função de uma série de pesquisas que vem sendo publicadas desde a década de 80, acreditamos que as periodontites devam ser encaradas como mais um fator de risco `as donças cardiovasculares. Alguns estudos verificaram um fator de risco adicional de até 2,8 para o infarto agudo do miocárdio. Outros, encontraram traços de bactérias periodontais na placa ateromatosa retirada durante cirurgias cardiovasculares. Ao observamos a fisiopatologia destas doenças notamos traços comuns, como por exemplo, o forte componente inflamatório e a orígem multifatorial de ambas. A intensa resposta imune gerada pelas periodontites parece ser o principal mecanismo envolvido na sua relação com outras doenças sistêmicas. As principais hoje estudadas são o diabetes mellitus, a atrite reumatóide, a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), úlceras gástricas ,pneumonias, além da indução do parto prematuro e claro, da doença cardiovascular. Com excessão das úlceras gástricas, possivelmente relacionadas ao patógeno H.Pylori, residente do biofilme dental, e as pneumonias causadas pela aspiração de bacterias orais, todas as demais encontram em seus mecanismos inflamatórios, pontos comuns que seriam os responsáveis por perpetuar ou agravar seus efeitos.
Sabor e Vida Diabéticos : Por que acontece sangramento na gengiva?
Dr.Luciano: A colonização microbiana da superfície dentária termina por gerar uma resposta inflamatória local que provocará ,dentre outros eventos, edema, aumento do fluxo sanguíneo e da fragilidade capilar, favorecendo o sangramento gengival.
Sabor e Vida Diabéticos : O que é lingua esbranquiçada?
Dr.Luciano: É a caracteristica provocada pelo acúmulo de resíduos alimentares, colônias microbianas e células epiteliais descamadas no dorso da lingua. Muito comum em indivídos com hiposalivação e halitose.
Sabor e Vida Diabéticos : A secura na boca e o hálito cetônico podem indicar uma descompesação de diabetes?
Sabor e Vida Diabéticos : A secura na boca e o hálito cetônico podem indicar uma descompesação de diabetes?
Dr.Luciano: Sim. O hálito cetônico está relacionado a longos períodos de jejum e a consequente utilização de ácidos graxos para a reposição energética no corpo. Este processo termina por gerar compostos de odor desagradável.
Sabor e Vida Diabéticos : Como tratá-las?
Dr.Luciano: Além do controle da ingestão de alimentos, corrigindo a hipoglicemia, está indicada a hidratação constante e muitas vezes a utilzação de saliva artificial como forma de diminuiir o desconforto causado pela secura na boca ( sensação de queimação).
Sabor e Vida Diabéticos : O uso de próteses mal adaptadas e dentes quebrados também traz mais riscos ao paciente diabético?
Sabor e Vida Diabéticos : O uso de próteses mal adaptadas e dentes quebrados também traz mais riscos ao paciente diabético?
Dr.Luciano: Próteses mal adaptadas e dentes quebrados servem como nichos ou reservatórios microbianos que devem ser evitados em quaisquer pacientes.
Sabor e Vida Diabéticos : Como deve ser feita a higiene oral? O paciente diabético deve ter algum cuidado especial? A higiene oral deve ser realizada sempre que fazemos uma refeição?
Sabor e Vida Diabéticos : Como deve ser feita a higiene oral? O paciente diabético deve ter algum cuidado especial? A higiene oral deve ser realizada sempre que fazemos uma refeição?
Dr.Luciano: Sabemos que a grande melhora alcançada no controle de cáries e gengivite na população sueca nos últimos 20 anos não resultou na correspondente queda de prevalência da periodontite severa. Este fato nos faz acreditar que higiene oral adequada pode não ser suficiente para prevenir esta doença. Exames periodontais regulares associados a uma boa técnica de escovação, não fumar, abandonar o sedentarismo e manter uma dieta saudável, parecem ser a melhor forma de prevenção destas doenças.
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