sábado, 15 de fevereiro de 2014

Diabetes Mellitus e Doença Periodontal


Diabetes Mellitus e Doença Periodontal

Por: 
Luciano Oliveira, DDS., MDSc, PhD
Membro do Board e Conselho Científco da Aesculap Academy.

Para a American Dental Association (ADA-1982), a prevalência de doenças periodontais em indivíduos diabéticos chega a atingir 39% entre os maiores de 19 anos. De fato, é freqüente observar nestes pacientes uma maior tendência a hiperplasias gengivais, pólipos, formação de abscessos, perda dentária e periodontite. Dessa forma, o conjunto de informações a respeito das conseqüências do diabetes mellitus mal controlado nos sugere que os tecidos orais possam ser afetados de forma similar ao que acontece em outros sistemas do corpo. 

Já foi demonstrado  que pacientes diabéticos com infecção periodontal possuem pior controle glicêmico do que os que não a apresentam. Isto ocorre pois muitos dos mecanismos pelos quais o diabetes mellitus  influencia o periodonto possuem uma fisiopatologia similar `as clássicas complicações micro e macrovasculares frequentemente observadas nestes pacientes. Sabemos que estados de hiperglicemia mantida resultam em alterações no metabolismo lipídico, assim como na glicosilação não enzimática de proteínas colágenas, glicídios e ácidos nucléicos. Esta condição altera as propriedades da membrana celular, modificando as relações célula-célula e célula-matriz. O agravamento deste quadro pode levar a formação de ateromas e microtrombos, espessamento da parede vascular com conseqüente estreitamente de sua luz e alterações na permeabilidade endotelial.  

Um levantamento realizado em 1990, abrangendo 2273 Indios Pima, encontrou 2,6 vezes mais doença periodontal entre portadores de diabetes do que entre não diabéticos. Neste estudo, o grau de controle glicêmico foi uma variável bastante importante, estando o seu mal controle relacionado a uma maior prevalência e severidade da inflamação gengival e destruição tecidual. 

Outra pesquisa de curta duração realizada em 1993 envolvendo diabéticos tipo II (DMII) com idade entre 35 e 56 anos, encontrou mais inflamação e sangramento gengival nos indivíduos com pobre controle glicêmico. E não para por aí. Em 1998, novamente utilizando a mundialmente conhecida população de índios Pima, um acompanhamento prospectivo demonstrou associação entre o controle glicêmico inadequado do DMII e o risco significantemente aumentado de perda óssea alveolar progressiva quando comparado a um grupo com bom controle glicêmico. 

Estas informações despertaram o interesse das autoridades de saúde norte americanas e deram orígem a um extenso levantamento longitudinal (Third National Health and Nutrition Examination Survey, NHANES III) onde ficou evidente que o grau de controle glicêmico era a variável mais importante na determinação do risco para doenças periodontais entre diabéticos. 

Estes dados por si já seriam suficientes para justificarem-se políticas públicas de saúde focadas na identificação e tratamento precoce das doenças periodontais em indivíduos diabéticos. Entretanto, um achado até o momento oculto revelaria-se ainda mais sombrio. Em função da alta prevalência de doenças cardiovasculares em indivíduos diabéticos e por estas responderem por mais da metade das mortes nesta população; e em função de estudos recentes correlacionarem de forma positiva doença periodontal e risco aumentado para infarto agudo do miocárdio, um estudo longitudinal envolvendo mais de 600 DMII  foi realizado para avaliar o efeito da doença periodontal sobre a mortalidade por causas múltiplas nestes indivíduos. Entre aqueles com periodontite severa, as taxas de morte por doenças isquêmicas do coração foram 2.3 vezes maiores do que entre indivíduos sem periodontite, mesmo após ajustes para outros fatores de risco conhecidos. Ainda neste estudo um grande alerta foi dado: Taxas de morte por nefropatias diabéticas foram 8.5 vezes maiores em indivíduos com periodontite severa. Isso mesmo, 8.5 mais mortes entre os que portavam além do diabetes, periodontite severa! As taxas gerais de mortalidade por doenças cardio-renais foram 3.5 vezes maiores neste mesmo grupo, sugerindo que a presença da doença periodontal pressupõe um risco adicional para mortalidade cardiovascular e renal em pessoas com diabetes. Se por um lado parecia haver uma feedback positivo nesta mórbida inter-relação, um aspecto ainda permanecia pouco explorado, o efeito do tratamento periodontal. E não demorou para que pesquisas intervencionistas sugerissem um potencial benefício metabólico obtido a partir de sua realização. Em um destes estudos, pacientes DMII bem controlados com  sinais de gengivite e periodontite   foram tratados periodontalmente e comparados `aqueles que não receberam tratamento. Após a terapia, os primeiros apresentaram  50% de redução na prevalência de sangramento gengival e uma redução na HbA1c de 7.3% para 6.5%. No segundo grupo não foram encontradas mudanças no sangramento gengival tampouco observadas melhoras no níveis de HbA1c. Estes resultados sugerem que modificações nos níveis inflamatórios gengivais podem impactar positivamente sobre o controle glicêmico. 

Muitos mecanismos podem explicar este fenômeno. Em linhas gerais, a inflamação possui um importante papel sobre a sensibilidade insulínica e a dinâmica da glicose. Evidências de diferentes estudos sugerem que doenças periodontais possam produzir ou perpetuar um estado inflamatório sistêmico. De maneira geral esta condição induziria resistência insulínica pela grande liberação de Fator de Necrose Tumoral alfa (TNF-alfa), reconhecido agente pró-inflamatório e um dos prováveis algozes por detrás disso tudo. Produzido em abundância tanto por adipócitos como em sítios de periodontites, esta citocina age diminuindo a eficácia da insulina. Diante disso tudo e por estas razões, a existência de uma relação entre infecções orais severas e o controle do diabetes tem sido tão estudada e continue merecendo nossa atenção.  


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